Esposa de Shaolin diz que ele não conseguia se olhar no espelho





Um grave acidente de carro ocorrido no dia 18 de janeiro de 2011, em Campina Grande, Paraíba, quase tirou a vida do humorista Francisco Josenilton Veloso, na época com 39 anos. Ele dirigia seu carro, um modelo Pajero, pela BR-230, quando seu veículo foi atingido na lateral por um caminhão que manobrava no acostamento da estrada. Shaolin foi levado às pressas para um hospital e lá foi diagnosticado com traumatismo craniano e teve ainda um grave ferimento no braço.

Quatro anos após ocorrido, o Portal R7 conversou com a mulher do comediante, Laudiceia Veloso, para saber como anda o estado de saúde deste homem que já arrancou risadas de um público fiel e que busca incessantemente informações sobre ele.

Laudiceia iniciou a conversa com uma boa notícia. Ela disse que o marido vinha mostrando uma discreta melhora, considerada bastante significativa em relação ao estado de saúde do humorista.

— Ele estava bem, as evoluções foram pequenas, no entanto, sempre crescentes. Nunca houve regressão de absolutamente nada.

Laudiceia detalhou quais foram essas melhoras.

— Quem sabe da história dele, sabe que Shaolin só se comunica por expressões, pelo olhar dele. É a única forma que a gente consegue falar com ele. Essa comunicação agora está mais rápida. Ele já está respondendo mais rápido. Vez por outra ele consegue um movimento de braço, um movimento de pernas. De fevereiro deste ano para cá ele avançou bastante.

Shaolin não vive uma vida vegetativa. Muito pelo contrário. Apesar dele não conseguir ficar em pé, pois o estado dele não permitia isso, a família o ajudava colocando o humorista em uma cadeira especial que dá acesso a outras partes da casa, inclusive a parte externa, onde tem uma piscina e uma varanda.

Laudiceia contou também que o marido sabia de tudo o que aconteceu com ele.

— Ele entendia o que aconteceu, até porque a gente trabalhava muito a paciência dele, porque Shaolin era uma pessoa muito hiperativa. Se você pega uma pessoa que é hiperativa, que conversava muito, e que de repente ela se encontra em um estado em que ela estava completamente impossibilitada de fazer o que fazia antes, ela precisa entender por que ela está ali. Então, desde o momento que percebemos que ele estava consciente e que ele tinha a capacidade de entender o que estava acontecendo, nós fomos trabalhando o emocional dele e explicando o que foi o que aconteceu com ele.

Ainda sobre o fato de Shaolin saber da tragédia, Laudiceia contou que o humorista entendia que a recuperação dele seria lenta porque o trauma aconteceu em uma área do cérebro que comanda o corpo e a voz.

Para a mulher do humorista, Shaolin não ficou triste, depressivo, tampouco inconformado com o acidente.

— Eu via ele totalmente resiliente, eu via ele buscando a melhora, todos os dias. Via ele tentando cooperar o máximo que ele pode com a fonoaudiologia, com a fisioterapia, porque isso dependia somente dele. Ele não estava conformado, ele estava resiliente com a situação dele.

Em 2012, Shaolin ganhou de presente uma máquina especial para poder se comunicar com os familiares. Trata-se de um computador com uma tela, que capta os movimentos dos olhos do paciente. Ele apresenta um teclado onde a pessoa vai olhando para as letras e vai formando um palavras, frases. No entanto, Shaolin não quis saber da tecnologia.

— Ana Hickmann sugeriu que Shaolin usasse a máquina para poder se comunicar com o público dele, mas diante disso ele travou. Ele não quis mais por não aceitar que seu público visse ele da maneira como ele estava. Ele queria que as pessoas olhassem ele, obviamente, bem. Alegre, fazendo brincadeiras, conversando com todo mundo. Não através de uma máquina, mas pessoalmente. Isso então entristeceu ele na hora.

A maneira como Shaolin costumava se comunicar com a pessoas era somente por meio de expressões faciais. Laudicéia diz que, quando ele estava feliz, ele sorria, se o assunto interessa a ele. Ele era muito participativo. A audição do humorista não foi comprometida, com isso, Shaolin compreendia tudo o que falavam a sua volta.

— Quando alguma coisa não agradava a ele, ele fechava os olhos ou virava a cabeça para o outro lado, não te dá atenção, essa é a forma que ele tinha de se comunicar com a gente.

Segundo a mulher, Shaolin participa de tudo o que acontecia na família, inclusive com os filhos.

— Ele continuava sendo o dono da casa. Tudo passava por ele. Nossos filhos pediam autorização a ele para poder sair, como sempre foi. Aqui ele participava de tudo, contribui com a movimentação da casa. A gente continuava conversando com ele, deixando ele ciente de tudo que está acontecendo, o que foi feito, o quer seria feito, tudo ele participava. Isso seria de extrema importância para a recuperação dele.

Laudicéia contou ainda sobre o que os médicos diziam a respeito da saúde dele.

— Para a medicina, Shaolin iria até um determinado ponto de melhora. Mas para gente, que estava todos os dias vendo o esforço e o avanço crescente, via que os que eles dizem pode mudar. Eu fui uma pessoa que acreditava na recuperação total dele. Eu me reservava no direito de me manter esperançosa, acreditando na recuperação dele.

Laudicéia contou também que ficou sabendo do acidente por meio de uma ligação de um de seus irmãos.

— Por alguns segundos eu fiquei em choque, mas no segundo seguinte tive que me recompor porque precisava tomar todas as providências necessárias. Já no hospital, ali eu olhava para todas as pessoas e via que cada uma estava mais desorientada do que a outra, porque não estavam acreditando no que estavam acontecendo, e alguém tinha que manter a cabeça fria para poder tomar as atitudes necessárias. Depois que já estava tudo organizado, depois que eu conversei com toda a imprensa, foi que eu me dei o direito de analisar o que está acontecendo. Eu realmente estava muito nervosa, muito tensa, e isso refletiu e reflete até hoje na minha saúde física, porque eu engordei 40 kg nesse tempo por estresse emocional.

No próximo dia 28 de dezembro, Laudiceia e Shaolin comemoraram comemorar 22 anos de casados. Desta união, nasceram dois filhos: Gabriela, de 23 anos, e Lucas, de 19, que inclusive é dirigido pelo pai em suas apresentações. Lucas seguiu os passos de Shaolin e hoje também é humorista.

— O Shaolin dirigia os shows de Lucas. Meu filho faz todo o roteiro dele do espetáculo. Se ele arrancasse sorrisos, é sinal que estava aprovado. Quando ele não gostava, ele virava o rosto de lado. E aí o Lucas descartava a piada imediatamente.

De amigos e familiares que deram e continuam dando apoio a Shaolin após o acidente, o cantor sertanejo Leonardo teve um espaço reservado no coração da família Veloso. Foi ele quem pagou uma UTI aérea para poder transferir Shaolin de São Paulo para a casa onde ele passou a morar, no momento em que os médicos disseram para a família que era hora de levá-lo para casa. Ele estava sem infecção e corria o risco de pegar alguma se ficasse lá.

— Leonardo é uma pessoa de um carinho muito grande, de uma amizade muito verdadeira. [Nesse momento, Laudiceia interrompeu a entrevista com risos, dizendo que Shaolin estava do seu lado, e que ele abriu um enorme sorriso quando o assunto era o amigo Leonardo]. Ele esteve aqui no começo do ano e fez uma visita muito carinhosa. Leonardo ligava sempre, pergunta se meu marido estava precisando de alguma coisa. Ele é uma figura maravilhosa.

Desde o ocorrido, Shaolin nunca mais saiu de casa. A família até propôs alguns passeios, mas por dois únicos motivos ele ainda permanecia em sua residência.

— Ele era muito conhecido aqui na cidade, muito famoso. Se eu fizesse isso [sair de casa com ele], a cidade parava. Não tinha como fazer isso. A gente já conversou sobre isso e todas as tentativas de tirá-lo daqui para passear em qualquer outro lugar, mas por vezes, foram negadas por ele. Ele não se sentia pronto ainda para isso.

Neste processo de recuperação, Shaolin não se deixa ser fotografado. Tanto é que quando a equipe de Gugu esteve na casa dele, em fevereiro deste ano, apenas uma pequena parte do perfil foi gravado. Laudicéia revelou também que, desde o acidente, Shaolin nunca mais conseguiu se olhar num espelho.

— Não tirei nenhum espelho de casa, mas eu respeitei os limites dele. Foi um trabalho muito delicado e lento, porque a gente foirespeitando o emocional dele. Ele estava bem. Ele estava normal, mesmo a gente dizendo que ele estava bem, bonito. Talvez ele não se olhassa com medo de achar uma imagem diferente.

Questionada sobre o sentimento dela e sua família em relação ao caminhoneiro, o homem que provocou o acidente, Laudicéia dá uma aula de maturidade.

— A gente não tem que olhar para essas coisas com maldade nem com mágoa, com tristeza ou com raiva, com revolta, porque isso não cabe dentro de um processo de recuperação. Isso foi uma fatalidade que aconteceu. Obviamente ninguém nesse mundo vai sair de casa pensando em bater o carro e machucar alguém. Eu acho que este rapaz já foi crucificado o suficiente, ele carrega um peso muito grande no coração dele e não há necessidade. Eu não condeno ele, meus filhos não condenam ele.